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Eu, você e toda uma vida (2025)




Eu, você e toda uma vida (You and everything else) é mais um dos grandes doramas lançados em 2025. Como dorameira, me senti muito bem alimentada neste ano: “Se a vida te der tangerinas...”, “Um amor no paraíso” e agora este, estrelado pela minha atriz sul-coreana favorita, Kim Go Eun, e também pela Park Ji Hyun (que roubou a cena).


Cada um desses três dramas tem a sua cor e trata de temas sensíveis à sua maneira. “Eu, você e toda uma vida”, por exemplo, trata de temas como o suicídio, a culpa, a depressão, relacionamentos complicados, identidade de gênero e mais uma infinidade. Não é um dorama que tem dó: ele vai lá e coloca o dedo na ferida, mas sem ser exacerbadamente dramático. Diria que é até cru, embora belo.


Não tenho me estendido demais nas resenhas, acho que perdi a minha muiteza, mas quero colocar minhas impressões, super pessoais, sobre esse drama que me arrancou muitas lágrimas e reflexões.


Portanto, sem mais delongas: simbora e com spoilers.




Esse dorama me destruiu do início ao fim.


Eu não sabia muito bem como ele iria seguir. Eu sabia que existia duas amigas e que elas tinham uma relação no mínimo complicada, e sabia também que uma estava doente. Pensei que elas haviam perdido o contato por conta da rotina e então se reencontraram após anos e anos. Achei que iria acompanhar toda a jornada delas se reencontrando e vivendo os últimos momentos juntas, já que uma estava em estado terminal.


Porém o dorama segue por outro caminho. Nós acompanhamos essa amizade complicadíssima que durou, contando do início ao fim, uns 30 anos – e que só terminou, de fato, porque uma das partes faleceu.


Não irei resenhar o drama todo, não irei focar no Sang-Hak², quero dar minhas impressões sobre a amizade em si e especialmente sobre o elefante na sala: Cheon Sang Yeon.




De 10 comentários sobre essa personagem, 9 são sobre ela ser uma amiga muito ruim, sobre ela ser invejosa ou má. Não julgo essas pessoas, mas assistindo esse dorama, eu não consigo ver a Cheon Sang Yeon somente dessa forma. Como diria o poeta contemporâneo Shrek: “os ogros são como cebolas; cebolas têm camadas; ogros têm camadas”. Eu vejo a Sang Yeon como uma cebola, cada camada representa uma experiência que ajudou a construir, ao longo de seus 42 anos de vida, seu próprio ser.


Portanto, acho que é muito fácil apenas tacha-la de invejosa ou de má, sem considerar as circunstâncias que fizeram ela se tornar quem é. Veja bem, não estou eximindo-a de seus erros. Se na casa dos 20 anos ela machucou a Eun Jung sem intenção, na casa dos 30 ela o fez deliberadamente. Só que retornando ao papo da cebola, também acho que ela foi moldada pelas experiências que teve desde a infância. Não justifica, é claro, mas dá para entender um pouco o porquê dela infelizmente ser assim


Se você olhar para a vida dela, temos uma garota que cresceu num lar frio. Não parecia ter muita demonstração de carinho ali, entre os membros da família, mas essa mesma menina viu seu irmão e mãe serem muito carinhosos com outra menina de sua idade [Eun Jung]. Então, com o passar do tempo, vem o baque do suicídio do irmão (que ela acreditava ser indiretamente culpada) e por consequência, a ruptura da família, com o pai indo embora e a falência.


Corta para os anos 20: essa agora adulta está quebrada. Nos flashbacks você vê que ela estava reclusa, apenas sobrevivendo. E então ela entra naquele chat e encontra um novo motivo para seguir em frente [Sang Hak].


Para sobreviver, ela trabalha em vários empregos e mora num cubículo bem ruim. Ela tem uma qualidade de vida dificílima e sofrida e muito diferente daquela de sua infância. Mas ainda assim, você percebe que ela tenta seguir em frente, que ela tenta ser uma pessoa boa mesmo estando emocionalmente quebrada. Ela gosta do mesmo cara que a amiga (começou a gostar dele primeiro) e em nenhum momento eu a vi fazer algo para atrapalhá-los, muito pelo contrário, ela guardou esses sentimentos dentro de si e tentou seguir em frente. Ela continuou tratando a Eun Jung do mesmo jeito. Infelizmente, com o segredo do irmão, ela indiretamente causou a ruptura do casal, mas não foi algo intencional ou deliberado, sinceramente não vejo maldade alguma.


Eu a entendo por querer guardar segredo da Eun Jung, era algo pessoal sobre o irmão dela, algo que SÓ ela saberia, ela precisava disso, ter uma parte dele que a amiga não tinha. Era como alimentar aquela menininha de 11 anos que viu o irmão ser mais próximo da amiga do que dela.


É claro que relações familiares – e relações no geral – não são tão simples. Na verdade, a mãe e o irmão a amavam muito, é claro, só tinham uma maneira diferente de demonstrar, mas como uma criança vai entender isso e como curar feridas abertas tão precocemente?


No ep. 04 [aos 39m.], na cena do jogo de futebol, a Sang Yeon está lá, toda avoada enquanto a galera está comemorando. A Eun Jung percebe, se aproxima, e a Sang Yeon diz para ela: “Eun Jung, já se sentiu assim? Quando você fica meio alheia a tudo, uma sensação de desconexão. Você se esforça para fingir que aquela é a sua realidade, mas depois de um tempo não consegue acompanhar e se sente desconexa. É quando a gente quebra”.


Cara, isso aqui acabou comigo. Esse trecho expressa o caos mental que a personagem vivia. Sem querer diagnosticar personagem, mas esse trecho parece descrever uma despersonalização, certo? Enfim. Muito triste. 




Agora corta para a casa dos 30 anos. Alguma coisa mudou aqui. Aquelas feridas abertas há tanto tempo não cicatrizaram e estão piores. Essa Sang Yeon é bem mais complexa. Se aos 20 anos aquela confusão interior a fazia se isolar e se auto machucar, aos 30 anos essa confusão interior a faz direcionar a raiva, a mágoa, o ressentimento para outras pessoas [Eun Jung].

 

Então aqui ela realmente faz coisas ruins deliberadamente. Ela fica bastante na defensiva, é orgulhosa, na mesma hora que está bem ela puxa uma discussão. Mas, o pior, claro, foi ela roubar o trabalho da amiga, causando outra ruptura de 10 anos. Porém, estranhamente, eu ainda sinto que ela faz essas coisas com dor, é difícil de explicar. É como se ela sentisse amor e ódio pela Eun Jung: o ódio queria ferir e o amor a fazia sofrer com essas decisões ruins. Acho até que há uma passagem em que ela diz que “destruindo a Eun Jung, ela também se destruiria” – e era o que ela queria. 


Brutal.




Chegando à linha do tempo atual, aos 42 anos, temos a Sang Yeon reaparecendo na vida da Eun Jung após 10 anos. Ela reaparece após uma ruptura terrível, após ela roubar o trabalho da amiga e prosperar em cima dele, se tornando uma grande diretora. É óbvio que a Eun Jung fica na defensiva e, com razão, afinal foi uma vida inteira de mágoas. Ela era uma tempestade se aproximando.


Mas a morte muda as pessoas. Você olhar para ela te faz pensar na vida. Você ver outra pessoa olhando também. Como eu disse, era uma relação complicada, tinha ódio mas também tinha amor. Dos 11 aos 42, essas garotas moldaram a vida uma da outra. Tinha admiração, tinha inveja, tinha muito carinho, abnegação e ressentimento, tinha tudo e não era unilateral, mas cada uma lidou com isso de uma forma.


Se a Sang Yeon não estivesse com câncer terminal, ela ainda teria procurado a Eun Jung para se desculpar? Se a Sang Yeon não estivesse morrendo, a Eun Jung teria perdoado-a? Não sei, mas sinto que em algum momento elas teriam se encontrado novamente porque é uma ligação de uma vida inteira, é difícil de quebrar. Eu acredito que exista esse tipo de ligação. Pessoas nascidas para estarem juntas, não necessariamente de forma amorosa.


E, bem, os episódios finais são de partir o coração. Você perceber que existe algo tão poderoso mesmo em meio a tanta dor. Uma ligação de uma vida que seria abruptamente interrompida, pois elas não iriam mais se encontrar daqui 10, 20 anos, como sempre fizeram – e que talvez fosse algo que, implicitamente, ambas sempre esperavam.


Ou elas se perdoavam e se acertavam agora, ou nunca.


A Sang Yeon precisou deixar o orgulho de lado para pedir perdão à Eun Jung e também para fazer o pedido de acompanha-la à Suíça. Já a Eun Jung precisou retirar forças de algum lugar para perdoar essa amiga num momento tão difícil e também para acompanhá-la numa viagem em que voltaria sozinha.

 

Eu não papeei muito sobre a Eun Jung porque ela é muito mais simples de ser lida, o que não é ruim. Ela soube fazer dos limões que a vida deu, belas limonadas. Mesmo com as dificuldades, ela permaneceu perseverante, forte e uma boa pessoa e amiga. Será que ter um lar funcional e de amor fez diferença? Provavelmente, quem sabe. Enfim.



 

Em algum momento dos anos 90, essas duas crianças se conheceram. Elas não faziam ideia de como uma moldaria a vida da outra. E nós? Fazíamos ideia de que pessoa x marcaria tanto a nossa vida? Todos temos alguém que nos marca.

 

Eu, você e toda uma vida, como o próprio nome diz, fala de uma ligação que durou por uma vida inteira. Nem mesmo o tempo ou as inúmeras mágoas destruíram essa ligação. Não é uma relação fácil ou simples, muito pelo contrário, existe muita mágoa e ressentimento, um pouco de competição e até inveja. Mas também existe amor, existe abnegação, existe renúncia e existe perdão. São duas pessoas que cresceram juntas e que experienciaram a vida de maneira diferente, tornando-se, assim, pessoas igualmente distintas, já que as experiências acabam nos moldando.

 

Talvez esse seja o meu dorama favorito do ano. É tão humano, doloroso, visceral. E, claro, verossímil, porque a vida é assim, nua e crua. Os relacionamentos não são perfeitos, embora, é claro, não precisem ser um peso. Mas também há certa beleza na dor. Perfeito demais não existe.






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