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Uma vida Interrompida, Alice Sebold




Uma vida Interrompida, memórias de um anjo assassinado. Comecei a ler este livro em 2016, mas não consegui concluir a leitura. Desde então, muito tempo se passou até eu esbarrar novamente neste livro e pegá-lo para ler. Estamos em 2023 e este é o primeiro livro do ano que leio, de forma bem tardia, mas muito recompensadora.


Lançado em 2002, Uma vida Interrompida é de autoria da escritora estadunidense 'Alice Sebold' e se tornou um best-seller, tendo sido adaptado para o cinema em 2009, sob direção de Peter Jackson, num projeto que ficou amplamente conhecido como 'Um Olhar do Paraíso', meu querido e precioso filme favorito de toda vida.


Irei papear sobre minha experiência com essa leitura e fazendo uma ou outra comparação com o filme, sim, pois seria difícil não relacionar livro x filme, ainda mais sendo um filme que me marcou imensamente. Se você não leu o livro ou não assistiu o filme, saiba que este artigo terá spoilers.





The Lovely Bones - ou Uma Vida Interrompida - memórias de um anjo assassinado, não é um livro de investigação policial - e tampouco, um livro só sobre luto. Alice Sebold nos transporta para uma história dolorosamente cativante, ambientada nos anos 70, onde crianças desaparecidas tinham suas fotos impressas em jornais. Susie Salmon, uma garota de 14 anos, sonhadora e com uma vida toda pela frente, tem sua curta vida interrompida de forma brutal, em um milharal à poucos metros de sua casa. O assassino? Seu vizinho de meia-idade, boa praça, mas com um quê de estranheza. 


O livro é narrado pela Susie e já começa nos apresentando sua morte. Era 07 de dezembro de 1973 e ela estava voltando para casa, seguindo um atalho por uma plantação de milho. Seu vizinho, com seu plano arquitetado há muito tempo, esperava-a no trecho e a convenceu a entrar com ele, num quartinho que o próprio construiu debaixo da terra. Susie era uma garota inocente e essas coisas não aconteciam... sr. Harvey, o vizinho, disse que esse quartinho era para as crianças do bairro brincarem e que queria que alguém (Susie) desse uma breve olhada nele, para ver se estava bom. Infelizmente, ela não conseguiu sair daquele quartinho com vida. Ora, violentada, ora, esquartejada. 


O brutal assassinato de Susie, dita todo o rumo da história e também, a vida das pessoas a sua volta. Seus familiares, amigos, comunidade e sua própria jornada pós-morte, onde ela se tornou uma grande espectadora do que acontecia na terra. Após sua morte, não demorou muito para a notícia correr ou para as buscas serem iniciadas - mas muito pouco foi encontrado para contar história, já que o sr. Harvey não fazia isso pela primeira vez, então agiu de forma meticulosa durante todo tempo. Retirou o corpo da Susie, destruiu o quartinho, tirou tudo (ou quase) que poderia se tornar um vestígio. Primeiramente, o cachorro de um dos vizinhos encontrou um cotovelo; depois, a polícia encontrou o caderno da Susie, com um bilhete de amor que só poderia ser dela; e uma peça muito importante também foi localizada: seu gorro, feito pela própria mãe. Não havia um 'corpo', mas havia uma quantidade significativa de sangue e objetos singulares: não era um caso de desaparecimento, mas sim, de assassinato. 






Do céu, Susie via cada pessoa que amava, lidando com o trágico luto, de uma forma. Seus pais se evitavam, sua mãe tentava seguir em frente, enquanto seu pai, vivia em prol da Susie, se agarrando a possibilidade dela estar viva - já que não havia um corpo - e posteriormente, em prol de pegar o monstro que tirou a vida de sua filha. Sua irmã mais nova, se fechou. Seu irmão mais novo, estava à deriva das coisas, até porque era muito pequeno. Ray Singh, seu grande primeiro e único amor, estava em choque. 


Diferentemente do filme, a linha temporal no livro é bem maior. A história se passa por toda década de 70, com o desfecho da história demorando quase uma década para acontecer - e quando falo de desfecho, quero dizer o julgamento - neste caso, 'divino', do sr. Harvey. A verdade é que ele conseguiu se safar do assassinato da Susie, pois, quando começaram as desconfianças acerca dele, ele simplesmente fugiu e viveu assim durante seus últimos anos de vida. O término dele foi igual o do filme: caindo de um desfiladeiro, ao perder o equilíbrio com a queda de um cristal de gelo em seu ombro. Particularmente falando, achei bem verossímil essa linha temporal, porque se trata de um assassino em série que atuava nos anos 70', onde era bem mais simples de se safar de certas coisas, num país tão grande e com as tecnologias criminais dando os primeiros passos. Durante a década ele foi lincado com outros assassinatos - ele cometeu vários, especialmente de jovens meninas - mas nunca foi pego.


No livro há algumas passagens sobre a infância nada normal que o sr. Harvey teve, com um pai abusivo e uma mãe, disfuncional, e em uma específica, há um trecho que me deixou pensativa: "ele tinha tido um instante de clareza, sobre como a vida deveria ser vivida: não como uma criança, nem como uma mulher: eram as duas piores coisas que se podia ser". De fato, quando adulto, seu rastro de assassinato caiu sobre crianças do sexo feminino. 


Ainda falando de linha temporal, com um espaço tão longo, todos os personagens viveram muitas coisas e das mais variadas formas. Lindsey Salmon, a irmã mais nova de Susie, viveu a vida que a Susie não poderia viver (e a Susie era uma espectadora assídua da vida da irmã). Ela viu a Lindsey conhecendo seu grande e único amor, Samuel Heckler; viu ela dando seu primeiro beijo, começando a namorar, ela crescendo, entrando no time de futebol, formando no fundamental, indo para a faculdade, casando... Esse contraste é bem triste, porque, a irmã que um dia fora a mais velha, simplesmente parou no tempo sem ter qualquer escolha: ela sempre seria uma menina de 14 anos. 


Ainda papeando sobre a Lindsey, não poderia deixar de mencionar o tríplex que ela alugou na cabeça do assassino de sua irmã. Ao invadir a casa dele e roubar o desenho/planta do quartinho subterrâneo que ele havia construído para emboscar sua irmã, ela fez com que o mr. Harvey tivesse que fugir de casa e isso perturbou ele pelo resto da vida. 5! 5! 5!





Ainda na família Salmon, os pais de Susie viviam um inferno interno, cada qual de uma forma. O Jack foi quem mais externou toda a dor da perda. De início, não aceitando que a Susie estava morta; posteriormente, querendo pegar o assassino a todo custo - e, a certa altura - direcionando toda essa raiva para o mr. Harvey, que o Jack desconfiava e com razão, que fosse o assassino de sua filha. Infelizmente, mesmo com as denúncias do Jack, nada foi resolvido, o mr. Harvey sempre conseguia passar a perna na polícia. Tivemos a fatídica cena do milharal, onde o Jack vai atrás do mr. Harvey, mas acaba trombando com a Clarissa e o Brian e é espancado. Depois disso ele meio que dá uma acalmada, mas muita coisa já estava quebrada, inclusive seu casamento. Abgail lidou com o luto de formas bem extremas: ora, tendo um caso extraconjugal com o detetive Len Fenerman, ora indo embora para outro estado e ficando fora por anos (o que afetou e muito o relacionamento dela não só, com o marido, mas com os filhos vivos também, Lindsey e especialmente o Buckley, que cresceu sem a mãe). 


Vovó Lynn, mãe de Abgail, esteve muito presente na vida da família depois do terrível acontecimento e ela foi um grande porto seguro; Buckley, o irmão mais novo de Susie, cresceu com uma grande confusão interna: sentia falta da mãe, do pai, que embora presente, era mentalmente distante - e acabou se fechando; - Pulando para o arco dos não-familiares, temos Ruth Connors, que não era de fato, amiga da Susie, mas que passou a ter uma conexão muito especial com ela, pois, no dia do assassinato, a Susie ao caminhar para o céu, acaba esbarrando em Ruth, fazendo esse laço eterno acontecer. Após isso a vida de Ruth acaba tendo um giro e ela pensa muito na Susie, fala muito dela e acaba se aproximando e criando uma linda amizade com o Ray Singh, o primeiro e grande amor de Susie. A Ruth, inclusive, acaba por desenvolver certa mediunidade, percebendo coisas que ninguém mais percebe, inclusive, tendo um contato direito com a Susie. 


Ray... O Mouro. Ray e Susie poderiam ter sido um lindo casal. Eles gostavam um do outro e estavam começando a se conhecer, quando a vida dela foi cruelmente roubada. De início, ele até mesmo foi considerado, por curto tempo, um possível suspeito, o que foi muito triste, pois ele era um menino de 14 anos apaixonado pela vítima. Ele havia escrito um lindo bilhete de amor para ela, que no filme é representado por um trecho inspirado em Otelo, O Mouro de Veneza de William Shakespeare. 


"Se eu tivesse somente uma hora de amor

Se fosse a única coisa que eu teria, 

Uma hora de amor nesta terra

Meu amor então eu te daria."



O Ray seguiu em frente após o assassinato da Susie, mas nunca a esqueceu completamente. Ele a Ruth tinham essa ligação fomentada pela memória da Susie. Olhando para a mensagem do bilhete, ele conversa muito sobre como a vida é imprevisível e pode ser curta. Um apelo para viver somente mais um pouco, uma hora que seja, com aquela pessoa amada - e isso de fato aconteceu no livro. Como comentei, a Ruth teve um contato direto com a Susie em forma de possessão, se é que posso dizer assim. Foi no momento em que ela e o Ray estavam passando pelo sumidouro que estava sendo totalmente soterrado (e onde os restos mortais da Susie estavam). Sem querer, a Susie cai do céu e entra no corpo da Ruth, enquanto esta, sobe para o céu. De início, a Susie não entendeu o que aconteceu e o Ray não havia percebido a troca: até que a Susie pediu-lhe um beijo. 


Essa cena também acontece do filme, mas de forma muito mais singela (até pela idade dos atores, no filme a linha temporal é mais curta, então o Ray também era jovem, então houve apenas um lindo e emocionante beijo). Já no livro, o Ray estava mais velho, na casa dos 21 anos para mais e ele e a Susie, quando este percebeu o que de fato estava acontecendo, tiveram uma linda tarde de amor. Eles viveram por '1 hora', o que não puderam viver enquanto ela estava viva. Eu amo as duas versões, a original do livro e a adaptada para o filme, inclusive acho de muito bom gosto e delicadeza a escolha do Peter Jackson. 






Uma Vida Interrompida se tornou um dos meus livros favoritos. Me apaixonei pela escrita da Alice Sebold com toda essa riqueza de detalhes e passei a amar ainda mais o filme também, que foi muito bem adaptado - embora tenha ocorrido uma ou outra alteração, que eu vejo como positivas. O caso extraconjugal da Abgail, a linha temporal, a cena final do beijo. Só houve uma coisa que não sei muito bem se gostei ou não: Holly. No filme, o assassino da Holly também é o mr. Harvey, mas no livro não. No livro de fato ele assassinou as outras vítimas que são mostradas no filme, como a Flora Hernandez, mas a Holly não, ela inclusive chegou ao céu três dias antes da Susie. 


Acredito que o Peter Jackson quis trazer uma proximidade maior para as personagens da Susie e da Holly, até mesmo para explicar a virada de chave na cabeça da Susie, quando ela descobre a verdade sobre a nova amiga dela. 


Eu poderia resenhar esse livro X filme por horas, rs, inclusive matutei por quase um mês sobre a construção dessa resenha, mas acho que o resultado final ficou interessante. E bom, vou ficando por aqui. Caso a gente não se veja, já sabe.


bom dia, boa tarde e boa noite












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